Em MG >> Arqueologia Fabular, da artista Juliana Galbetti, é um dos destaques da 7ª Bienal do Sertão | Exposição

Juliana Galbetti leva Arqueologia Fabular à Bienal do Sertão e propõe novas narrativas a partir de objetos cotidianos


Trabalho integra a 7ª edição do evento, cujo tema é Poesia e Confluência, que acontece entre os dias 1º e 31 de outubro em Diamantina, Minas Gerais

Foto da instalação Arqueologia Fabular - de Juliana Galbetti - Fotos Gui Gomes



 

A instalação participativa Arqueologia Fabular, da artista Juliana Galbetti, é um dos destaques da 7ª Bienal do Sertão, que acontece em Diamantina (MG), de 1º a 31 de outubro de 2025. A obra leva para o espaço as ações educativas como prática artística em si e não apenas como complemento da mostra. Em exposição no Teatro Santa Izabel, o público poderá participar de ativações da instalação nos dias 03, 06, 07, 08, das 10h às 12h e das 14h às 17h. A Bienal ainda se espalha por mais dois espaços da cidade — Museu do Diamante e UFVJM — e tem entrada gratuita. 

Criada em 2012 pelo historiador e curador Denilson C. Santana, a Bienal se firmou como um espaço de circulação e encontro, reunindo artistas de diferentes regiões do Brasil e do mundo em edições itinerantes. Em 2025, a curadoria é de Laura Benevides e Janaina Selva, que apresentam um recorte plural da produção contemporânea. Ao lado de Galbetti, participam nomes de destaque como Alana BarboAmbuáCamila Kahhykwyú CanelaDerlonConceição MyllenaRafael Vilas FreireSofia Ramos e Taís Koshino, além de artistas internacionais como María Zegna (Argentina)Helena Sofia Klipp (Alemanha) e a dupla Polina Shklovskaya & Briseis Schreibman (Rússia/EUA).

Inspirada em práticas educativas de instituições culturais, Arqueologia Fabular propõe estimular a escuta simbólica e a leitura crítica de objetos. O trabalho parte das classificações tradicionais e do vocabulário visual presente em arquivos, acervos e reservas técnicas, para então deslocar a forma como damos significados a objetos e histórias. A proposta é criar uma experiência em que o público organize objetos a partir de critérios subjetivos, criando narrativas próprias. 

Durante a dinâmica, os visitantes, divididos em trios, recebem caixas com itens variados — que vão de materiais de escritório a peças usadas em festas — e podem incluir também objetos pessoais. Assim, o espectador assume o papel de curador, enquanto o mediador se torna performer, aproximando arte, corpo e memória.

Como na arqueologia, onde os achados são analisados sem ideia prévia do que sejam ou a qual cultura pertençam, a obra de Galbetti também lança o olhar para os objetos, questionando os significados que carregam e transformando a forma como nos relacionamos com eles e entre eles. 

“Gostaria que o público olhasse para o mundo de modo mais questionador, entendendo que as coisas só ganham sentido pelo contexto ou pela relação com outros objetos. Muitas vezes surgem associações que nem podem ser explicadas em palavras. É lindo como neste trabalho as coisas acontecem no ‘entre’”, comenta Galbetti.

Como parte do projeto, ao final, cada arranjo é fotografado e publicado no Instagram @arqueologiafabular, registrando essa exposição efêmera que se recria a cada encontro. É possível participar de duas formas: em visitas rápidas, no horário da exposição, ou em oficinas coletivas de 30 a 40 minutos, em que a experiência é conduzida de maneira mais aprofundada. 

Sobre essa fase da instalação, em que as fotografias gravam o fugaz, Juliana resgata o  historiador de arte alemão Aby Warburg: “ele organizava imagens em pranchas, o Atlas Mnemosyne, lado a lado, para que surgissem constelações de sentido a partir da relação e da comparação”, conta a artista. “Warburg acreditava que certos gestos, expressões e símbolos atravessam séculos, sobrevivendo e reaparecendo em novos contextos. Cruzava erudição histórica, olhando para as artes, com fabulação, e as suas pranchas não tinham legendas fixas, eram abertas a múltiplas leituras.”

De acordo com ela, por isso que em Arqueologia Fabular  cada “constelação” montada na mesa é fotografada e colocada lado a lado na plataforma digital. “O arquivo não é fechado, é fabular. Permite leitura poética, múltiplas tags, relações inesperadas. O corpo do público - mãos, escolhas, gestos - é o motor que reorganiza e produz pensamento”, explica.

Na obra em exposição, cada gesto do público reativa os objetos do cotidiano e cria novas relações que fogem da lógica museológica tradicional. O resultado é um “Atlas Vivo” em constante mudança, um espaço onde memória, corpo e imaginação se conectam e se atravessam.

Assim, inserida em uma Bienal que a cada edição ocupa uma cidade diferente e conecta artistas de múltiplas origens, Arqueologia Fabular afirma sua força ao lado de nomes importantes da cena contemporânea e amplia o diálogo que caracteriza o evento desde sua criação. O gesto se relaciona tanto com o princípio duchampiano do ready-made — o contexto como operador de sentido — quanto com a experiência neoconcreta de participação sensorial proposta por Lygia Clark e Hélio Oiticica. No contemporâneo acelerado, digitalizado e pré-formatado, Arqueologia Fabular propõe um convite a recompor nossa relação com as coisas do mundo.

7ª Bienal do Sertão

Este ano, a Bienal do Sertão tem como tema Poesia em Confluência e se consolidou como evento itinerante de caráter artístico e pedagógico, reunindo artistas, instituições e centros de pesquisa em torno de reflexões sobre o território do sertão brasileiro. Definida como uma ‘bienal de bioma’, alterna suas edições em diferentes localidades, articulando exposições contemporâneas e históricas, sempre com entrada gratuita e em diálogo com a pesquisa acadêmica.

Para Juliana Galbetti, essa temática pede da arte um gesto que não separe estética de ética, material de pensamento, forma de urgência. Assim, a mostra reúne obras porosas, impuras, encantadas e críticas que habitam a fricção entre o visível e o indizível, entre a inscrição e o apagamento, entre o que é dito e o que resiste em silêncio.

Os trabalhos apresentados nesta edição dialogam em torno de preocupações comuns: a ideia de arquivo vivo e memória em disputa, a investigação dos territórios e suas poéticas — sejam eles o sertão, a floresta, a cidade ou o corpo —, e o desejo de abrir espaço para escuta e participação do público. Também emergem práticas que evocam cosmologias decoloniais e repensam narrativas hegemônicas, experimentações com a materialidade crítica (da luz ao metal, do tecido ao resíduo) e pesquisas sobre linguagem, tipografia e tradução como campos de sentido. É nesse contexto que Arqueologia Fabular se insere, propondo um arquivo em constante transformação, onde objetos cotidianos se tornam matéria de fabulação e reclassificação coletiva.

Sobre Juliana Galbetti

Graduada em Moda pela Santa Marcelina, Juliana Galbetti iniciou sua trajetória nas artes visuais em 2018, após carreira consolidada entre moda, comportamento e arte. Sua produção transita por diferentes mídias — esculturas, objetos, fotografias, bordados, instalações, arte têxtil e performance — explorando as tensões entre o subjetivo e o físico.

As obras partem do atrito entre materiais carregados de significados culturais e questões existenciais contemporâneas, resultando em desdobramentos poético-políticos que buscam fissuras no que consideramos concreto e usual. O simulacro aparece como estratégia crítica à representação, movendo-se nos limites entre ficção e legitimidade, injustiça e direito, invisibilidade e memória.

A artista investiga como resíduos, documentos e corpos testemunham a experiência humana, suas inter-relações e narrativas históricas, operando obras que funcionam como escavações de sentidos arqueológicos do presente.

SERVIÇO

Instalação Arqueologia Fabular, na Bienal do Sertão

Local: Teatro Santa Izabel - Foyer - Praça Dom Joaquim, 166, Centro - Diamantina (MG)

Entrada gratuita

Dias e horários do Teatro Santa Izabel durante a Bienal do Sertão:

Segunda a sábado das 9h às 18h

Dias e horários das ativações da instalação Arqueologia Fabular (com mediação): 

Dias 03, 06, 07, 08 de outubro, em sessões de 30/40 minutos

Horários: das 10h às 12h e das 14h às 17h

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Bienal do Sertão de Artes Visuais
Diamantina (MG)
Data:
 1º a 31 de outubro de 2025
Locais expositivos: 
Museu do Diamante, Teatro Santa Izabel, UFVJM

Entrada gratuita 

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