LANÇAMENTO: A narrativa transcestral, o pop periférico amazônico e a arte política de Melissandra no álbum "MAPARÁ"
ATRAVÉS DE NARRATIVAS TRANSCESTRAIS EMBALADAS POR UM POP AMAZÔNICO, MELISSANDRA CONTA A HISTÓRIA DE “NIK LAMENTO” NO ÁLBUM MAPARÁ
A artista paraense mergulha em uma travessia sonora potente, onde identidade, encantaria e resistência se entrelaçam em forma de música
Melissandra como NIK LAMENTO
Foto: Tereza Maciel
Belém, junho de 2025 - No dia 13 de junho, Melissandra lança MAPARÁ, seu terceiro álbum de estúdio, pela gravadora Guamaense Produções. Assinando a direção geral, produção e concepção, a artista paraense entrega um disco marcado por experimentação estética, narrativa transcentrada e uma mistura potente de sonoridades amazônicas, urbanas e ancestrais.
O álbum é guiado pela história de A NIK LAMENTO, personagem criada por Melissandra e Htadhirua (diretora de arte e criativa do projeto), inspirada nas encantarias da Amazônia: NIK LAMENTO, mulher travesti que foi perseguida e morta no período da colonização brasileira pela Companhia dos Padres Jesuíticos. Foi condenada pela lei da inquisição por bruxaria, sodomia e práticas de magia. Foi queimada viva e suas cinzas espalhadas nas águas que rodeiam Belém, para que nunca pudesse retornar. Nas águas, NIK é encantada no peixe MAPARÁ. Na encantaria, NIK se torna patrona das mulheres e se comunica com o mundo mortal através do MAPARÁ, onde reza a lenda que durante a noite, se tu comeres um Mapará, uma mulher irá até a porta da sua casa e bater quatro vezes, te perguntando “Me diga, qual teu lamento?”.
“Falar sobre uma mulher que foi morta durante a inquisição no Brasil no território amazônico, evoca discussões pertinentes e presente até os dias atuais como a exploração dos recursos naturais, a venda, rapto e estupro de crianças indígenas no comércio das grandes madeireiras, o assassinato de tantas lideranças de comunidades ribeirinhas, indígenas e quilombolas no interior do estado. Porque sobretudo são essas mulheres que até hoje enfrentam lutas pela defesa do seu corpo e do seu território”, explica Melissandra. “Não é exatamente que vai além, mas os dois discursos estão imbricados um ao outro de forma que não se dissociam. A luta de gênero também perpassa a luta pelo território se tratando de região amazônica por causa dos contextos políticos desenrolados ao longo dos anos aqui. Tentamos retratar esses aspectos em uma parte do photoshoot do disco, onde podemos perceber NIK presa em uma rede de pesca cheia de lixos.”
A obra é dividida em dois lados. O Lado A (faixas 1 a 5) mergulha no funk e no rap, refletindo os desejos, dores e vivências de NIK em carne mortal. O Lado B (faixas 6 a 12) representa sua divinização, com sonoridades regionais como o brega, o carimbó e o côco, abrindo espaço para mensagens de cura, encantamento e vitória travesti.
O disco começa com a instrumental “Transe”, que prepara o mergulho nesse universo. Em seguida, “A NIK LAMENTO” apresenta o espírito da personagem em funk e rap, evocando desejo e empoderamento. “Eu Não Quero Compromisso”, primeiro single, segue essa força, assim como “Suco de P**a”, feita para divertir o público. “Divina”, com Rafa Bebiano, encerra o lado A com crítica à transfobia e homenagem às divas travestis. O lado B inicia com “Encantamento”, feat. Coytada, celebrando a força coletiva trans da Amazônia. “Maniçoba (A Verdadeira)” lança um feitiço debochado contra o mau olhado. “Praia do Tucunaré” é romântica e safada, e “Dia Meu Sem Tu”, puro brega paraense para sofrer dançando. “História de Pescador”, com Iris da Selva e flautas de Luany Guilherme, é o primeiro carimbó da artista. Em “Materna”, Melissandra revela sua vivência como mãe travesti em um delicado côco de ninar. Por fim, “Evocação”, segundo single, costura samba e pop eletrônico para resumir a história da entidade encantada e abrir caminho para os próximos rituais sonoros de MAPARÁ.
“MAPARÁ é a voz transcestral de disseminação e consolidação do meu trabalho enquanto uma diva pop completa. Aqui, atinjo a coesão, coerência e amadurecimento que desejei construir desde o início”, descreve a artista.
Com produção musical assinada por BEA, o disco é um mergulho íntimo, político e poético. “Produzir MAPARÁ foi como um mergulho no fundo do rio. Intenso, íntimo e inesperado. Construímos algo para além da música: uma travessia de verdades, acolhimentos e descobertas que transformaram nossa sonoridade. Uma travessia trans, amazônica e absolutamente única.”
No dia 14 de junho, ela apresenta de forma gratuita o espetáculo MAPARÁ: A Voz Transcestral na festa Quadrilha Fogo no Rabo, que este ano está em sua 25ª edição.
MAPARÁ se estabelece como um marco na trajetória de Melissandra — não apenas enquanto artista, mas como corpo político e espiritual em movimento. Ao invocar a força encantada de NIK LAMENTO, o disco transcende a música para erguer um manifesto que entrelaça território, memória e identidade travesti na Amazônia. É um convite ao lamento, mas também à celebração de uma estética transcentrada que rompe silêncios históricos e reafirma a presença de corpas dissidentes na linha de frente da arte brasileira. Com potência, beleza e coragem, Melissandra entrega um trabalho que ecoa nas águas, na mata e no som como reza, grito e renascimento.
Capa e contra-capa de MAPARÁ por Louezley Sol
OUÇA MAPARÁ
LADO A
1. Transe (intro)
2. A Nik Lamento
3. Eu Não Quero Compromisso
4. Suco de P***ta
5. Divina (feat Rafa Bebiano)
LADO B
1. Confluência (feat Mother Coytada)
2. Maniçoba (A Verdadeira)
3. Praia do Tucunaré
4. Dia Meu Sem Tu
5. História de Pescador (feat Iris da Selva)
6. Materna
7. Evocação
FICHA TÉCNICA
Direção Geral, Produção e Concepção: Melissandra
Direção de Arte e Criativa: Htadhirua
Produção Musical: BEA
Identidade visual e gráfica: Louezley Sol
Fotografia: Tereza Maciel
Figurino: Mulambra + Ferreiro
Beleza: Pietra Pojo
Cabelo: Monas Braids
Assistente de Produção: Noah Aracati
Assistente de set: Bianca Machado
Conteúdo Móbile: Thamires Farias
Maracas, Atabaque, Teclado, Guitarra, Pandeiro, Violão: BEA
Flautas: Luanny Guilherme
Coro: Noah Aracati, Uritã, Lou, BEA
Comunicação: Alice Leão
Assessoria de Imprensa: Leandro Moreira, Letícia Tie
Produção Executiva: Débora Mcdowell
Apoio: Quadrilha Fogo no Rabo, Larissa Martins, Muamba Estúdio
Agradecimentos especiais: Mãe Rosa Luyara, Dona Graça, Templo de Rainha Bárbara Soeira e Toy Azaká, Minha mãe Cristina, meu noivo Noah Aracati, meus filhos Akauê e Josué, Raiara, Íris da Selva, Coytada, Angélica Bebiano, Rafa Bebiano, Maria Flor Calçado, Ferreiro.
SOBRE MELISSANDRA
Melissandra é cantora, compositora e performer paraense, nascida em Marabá e atualmente baseada em Belém (PA). Com 27 anos, é uma das vozes emergentes do pop amazônico contemporâneo, unindo sonoridades do norte do Brasil a ritmos como funk, rap, trap, brega e carimbó, sempre atravessados por vivências trans e críticas sociais. Iniciou sua trajetória em 2016 nas batalhas de rima e slam de Marabá. Em 2017, gravou sua primeira música, “Armário”, lançada oficialmente em 2019, ano em que também abriu o show da Jaloo em sua cidade. Em 2020, lançou o disco de estreia Matinta, com videoclipes premiados nos circuitos de cinema paraense. Em 2022, já morando em Belém, lançou o álbum Manchete, se apresentando em festivais como Manas em Cena e Festival Psica. Desde 2023, cursa Ciências Sociais na UFPA, onde iniciou a pesquisa que deu origem ao seu terceiro álbum, MAPARÁ (2025), lançado pela Guamaense Produções. O disco apresenta a lenda ficcional de uma travesti amazônica transformada em entidade após ser perseguida e morta na era colonial, dividindo-se em dois lados: um voltado ao rap e ao funk, e outro aos ritmos tradicionais nortistas. Melissandra se afirma como uma diva pop amazônica, artista completa e necessária, com uma estética potente e uma obra que rompe estereótipos sobre a produção cultural da região Norte.
SOBRE HTADHIRUA
Nem homem nem mulher; Htadhirua é debochanty de cistemas de opressões. Se identifica como Travesty Não Binária e preta com ancestralidade indígena. Reside atualmente na sua cidade natal Ananindeua no Pará, uma das cidades mais violentas do país para corpos que transitam feminilidade. Constantemente ameaçada de morte e anulada socialmente por causa de suas narrativas, ela dilata as noções binárias de arte, educação, trabalho e mobilização social.
SOBRE BEÁ
BEÁ é produtore musical, atuante e pesquisadore no campo da guitarrada e carimbó, sendo ume des fundadores do duo Guitarrada das Manas, lançando em 2019 o disco Guamaense com o patrocínio do Natura Musical e tendo se apresentado em festivais como Rock in Rio, Virada Cultural de São Paulo e festival de Jazz de Salvador.
SOBRE RAFA BEBIANO
Cantora, compositora, podcaster e articuladora cultural independente, Rafa Bebiano (natural de Lorena-SP) lançou em 2022 o seu primeiro trabalho autoral, intitulado “Legítima”.
SOBRE COYTADA
Rafaela Cristina, travesti amazonida que dá vida a persona COYTADA. É discente em dança (UFPA) e participa da cena belensene com o coletivo das themônias e comunidade Ballroom Pará. Mother da Haus Of Carão, atua como produtora cultural, mestre de cerimônia, performer e DJ desde 2019 em Belém.
SOBRE IRIS DA SELVA
Iris da Selva, nascido em Icoaraci, Belém, é um artista trans que reinventa o carimbó com uma mistura única de tradição e modernidade. Atuando como cantor e compositor, Iris lançou dois EPs aclamados e colaborou com nomes importantes da música paraense. Em 2024, lançou o videoclipe Sonho de Floresta e prepara o lançamento de seu primeiro álbum, onde explora temas LGBTQIA+ e experiências românticas, consolidando sua presença na cena musical brasileira.
SOBRE LOUEZLEY LUZ
Produtor cultural, videomaker e designer, produtor há 5 anos da Quadrilha Junina Fogo no Rabo (desde 2000), produtor do documentário da quadrilha, com o qual ganhou os editais de audiovisual da Lei Paulo Gustavo e Itaú Rumos Cultural. Idealizador, produtor e oficineiro do projeto de documentário com celular EuDitando a Minha História.
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