"Os quatro da Calendária" - Pela 1ª vez no Brasil, Netflix implementa 'cuidadoria' em set de filmagem com foco na saúde mental
Pioneirismo e cuidado
Pela primeira vez no Brasil, série da Netflix implementa 'cuidadoria' em set de filmagem com foco na saúde mental do elenco infantojuvenil em produção que aborda temas sensíveis
Nos bastidores da série, a Casa Ojô, empresa de arte, educação e consultoria em diversidade, desenvolveu um trabalho inovador de "cuidadoria" com foco no bem-estar de todos os envolvidos
A minissérie "Os Quatro da Candelária", um dos grandes sucessos recentes da Netflix, reacendeu a discussão sobre a responsabilidade do mercado audiovisual com crianças e adolescentes negros que interpretam papéis em produções que abordam temas complexos e traumáticos.
A produção, que retrata as 36 horas que antecederam a trágica chacina de 1993 na vida de quatro crianças, ganhou ainda mais relevância em novembro, mês da Consciência Negra. Com direção de Luis Lomenha e Márcia Faria, a série, que mistura ficção e realidade a partir de relatos de testemunhas, tem conquistado o público com sua dramaturgia criativa e delicada, que aborda temas como racismo e exclusão social sem cair no panfletarismo.
Produções audiovisuais que retratam temas como violência exigem atenção especial ao elenco, especialmente quando se trata de atores infanto-juvenis. A história de Fernando Ramos da Silva (assassinado aos 20 anos após interpretar o personagem Pixote) nos convida a refletir sobre como a indústria audiovisual evoluiu em relação ao cuidado com atores mirins, e como ainda há muito a ser feito. Mas, nos bastidores da produção da Netflix, uma iniciativa inovadora busca proteger a saúde mental do elenco e da equipe: a Casa Ojô, empresa de acolhimento psicossocial formada por uma equipe multidisciplinar, implementa um programa de acompanhamento que vai muito além do cumprimento das normas.
Com um compromisso em comum de promover valores ESG (ambiental, social e de governança) e a saúde emocional em produções audiovisuais, os quatro sócios da Casa Ojô - Nana Santana, Davi Heller, Rodrigo Abreu e Luma Reis - uniram suas expertises para criar um ambiente de acolhimento e apoio nos bastidores da minissérie. A empresa desenvolveu um trabalho fundamental de acompanhamento com o elenco e a equipe, impactando positivamente a produção.
A Casa Ojô oferece um programa de acompanhamento que inclui acolhimento psicossocial, orientação individual e familiar, oficinas de desenvolvimento pessoal, mediação de conflitos e atividades que promovem a integração da equipe.
"Acreditamos que a responsabilidade do setor audiovisual vai além de entreter", afirma Nana Santana, fotógrafa, educadora e mestre em Artes Visuais pela ECA/USP, com ampla experiência em projetos de inclusão social.
"É preciso desenvolver ambientes seguros e construtivos que reconheçam a individualidade das realidades e vivências das pessoas, especialmente em produções que abordam temas sensíveis como racismo e violência." conta.
A "cuidadoria", como é chamado esse acompanhamento pela Casa Ojô, vai além da psicoterapia tradicional. É uma abordagem que integra diferentes saberes para promover o desenvolvimento artístico, o bem-estar, a formação e a integração de valores ESG no ambiente de trabalho, facilitando o diálogo e a construção de pontes entre diferentes realidades.
No caso de "Os Quatro da Candelária", o acompanhamento foi direcionado ao elenco principal e seus familiares.
Arte e diálogo como ferramentas
A Casa Ojô utiliza a educação, a arte e o diálogo como ferramentas para promover a inclusão e o bem-estar ao longo da produção, com foco na formação e desenvolvimento pessoal dos artistas e suas famílias. O trabalho incluiu sessões individuais e em grupo, abordando temas como construção de autonomia, desenvolvimento de habilidades socioemocionais, e fortalecimento da autoestima. O objetivo é empoderar os participantes a lidarem com os desafios da profissão e da vida pessoal, construindo um futuro mais promissor.
"Para nós, o acompanhamento não se trata apenas de prevenir crises, mas também de promover o desenvolvimento pessoal e profissional de cada indivíduo", complementa Davi Heller.
A experiência da Casa Ojô levanta questões importantes sobre a necessidade de um protocolo de cuidados com crianças e adolescentes negros que participam de produções audiovisuais que retratam a violência. É preciso ir além das obrigações legais e oferecer suporte psicológico contínuo, prevenindo traumas e promovendo o desenvolvimento saudável desses jovens.
Facilitar a transformação
"Nosso papel é o de facilitar o diálogo entre lideranças de diferentes setores para se engajarem nessa transformação", explica Rodrigo Abreu, arte-educador, mestre em Arte Educação pela Unesp, e pesquisador de metodologias artivistas e reparadoras de danos socioemocionais para grupos historicamente oprimidos.
"Muitas lideranças no Brasil têm um repertório limitado quando se trata da discussão sobre o racismo. A mudança e o progresso prático nessa frente demandam o fortalecimento do conhecimento de líderes sobre o tema, de maneira que eles e elas possam influenciar a implementação de práticas que promovam essa equidade."
"Não se tratava de filantropia, mas de oferecer ferramentas para que cada um pudesse se cuidar e amadurecer", afirma Nana Santana. O impacto foi notável, especialmente entre os jovens atores, que demonstraram maturidade e resiliência durante as gravações e na divulgação da série.
Para Davi Heller, a iniciativa da Casa Ojô demonstra que a saúde mental é um investimento com retorno garantido. “Pessoas emocionalmente saudáveis são mais produtivas e criativas", ressalta.
A empresa, que oferece serviços como mediação de conflitos e formação em diversidade, equidade, inclusão e ESG, promoveu um ambiente de trabalho mais colaborativo e respeitoso durante as gravações de 'Os Quatro da Candelária'.
Além disso, o trabalho de desenvolvimento humano realizado pela Casa Ojô, que inclui programas e atividades para o desenvolvimento de habilidades socioemocionais, contribuiu para o amadurecimento do elenco e para a criação de um clima mais positivo no set.
De olho no futuro
O sucesso da experiência em "Os Quatro da Candelária" impulsionou a Casa Ojô a expandir sua atuação, oferecendo consultoria para outras produções audiovisuais que abordem temas sensíveis.
A empresa se posiciona como pioneira em um movimento crescente por sets de filmagem mais humanos e sustentáveis. "O mercado audiovisual precisa se responsabilizar pela saúde mental de seus profissionais", defende Rodrigo Abreu, pesquisador, mestrando em arte-educação na UNESP (2022), pesquisa metodologias artivistas e reparadoras de danos socioemocionais para grupos historicamente oprimidos. A Casa Ojô está pronta para auxiliar nesse processo, promovendo a inclusão e o bem-estar como pilar central.
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