Em celebração
ao centenário do músico e compositor brasileiro Gilberto Ambrosio Garcia Mendes
(1922-2016), o Sesc Consolação recebe a exposição "Gilberto Mendes 100”.
A mostra, que teve sua estreia no Sesc Santos em 2022, chega à capital paulista
com curadoria assinada por Lorenzo Mammi e consultoria de Lívio Tragtenberg.
A abertura da exposição acontecerá no
dia 6 de julho, quinta-feira, às 19h. Durante o evento,
o público terá acesso às matrizes de uma mesa de impressão serigráfica para a
produção de cartazes contendo imagens de partituras criadas e poemas musicados
pelo maestro e compositor. A entrada é gratuita, e a visitação estará aberta
até dezembro.
A exposição, assim como sua obra, parte
de Santos, celebrando seu forte vínculo com a cidade, para se expandir além dos
limites do município, cumprindo seu objetivo de estimular, formar e divulgar a
produção de música erudita contemporânea na América Latina. O mesmo propósito
fundamenta a itinerância da mostra para o Sesc Consolação, cuja atuação se destaca,
desde sua inauguração, por importantes iniciativas de difusão da música
erudita.
Organizada em cinco áreas temáticas, chamadas de “ilhas”, a
mostra apresenta diferentes aspectos da trajetória do compositor, em uma
oportunidade de explorar a diversidade do seu trabalho, que transcendeu os
limites da música e criou uma intersecção com outras formas de expressão
artística, como a literatura, o teatro e o cinema. Cada núcleo
apresenta um cenário singular, com elementos visuais e sonoros
cuidadosamente selecionados para evocar a atmosfera e a inspiração por trás de
composições do músico.
Além disso, os visitantes poderão rememorar as execuções musicais,
sempre que possível evidenciando a relação das peças com as respectivas
notações ou instruções, e relacionando-as ao contexto em que as obras foram
produzidas por Mendes.
Gilberto Mendes contribuiu significativamente para a difusão da
música contemporânea no Brasil. Sua abordagem inovadora e experimental
permitiu que ele rompesse com as convenções da música erudita, tornando-a
acessível a um público mais amplo. Seu legado como músico, compositor, pioneiro
da Música Concreta e professor deixou uma marca no cenário artístico
brasileiro.
A versatilidade de Gilberto Mendes
Músico, compositor, pioneiro da Música
Concreta, professor.
Na exposição, a primeira “ilha” mostra Santos Football Music
(1969), uma de suas composições experimentais mais complexas e ambiciosas,
feita para grande orquestra, com participação do público. Foi apresentada pela
primeira vez em 1973 pelo maestro Eleazar de Carvalho, no 17º Festival de
Música Contemporânea em Varsóvia, na Polônia. Através da apresentação de uma
gravação com locução esportiva, as pessoas são sensibilizadas para a
dimensão musical de sons de uma partida de futebol, assim como são
convidadas a abandonar o papel de espectadoras para se tornarem integrantes na
execução da peça. Com Santos Football Music, música em homenagem ao Santos e ao
futebol de Pelé, Gilberto Mendes arrebatou plateias do Brasil e do Mundo.
O segundo núcleo aborda sua relação com a cidade de Santos,
terra natal do músico. Gilberto Mendes passou praticamente a vida inteira na
cidade e fez várias referências a ela e seu entorno em suas composições. Estas
citações podem ser ouvidas em Saudades do Parque Balneário Hotel para
saxofone e piano (1980), composta para lembrar o grande complexo albergueiro
construído em 1914 e demolido em 1973, que por várias décadas foi um marco
arquitetônico e um ponto de referência da vida musical da cidade, e em Vila
Socó meu amor, para coro feminino a três vozes, escrito sob o impacto
da tragédia da favela de Vila Socó, em Cubatão, em 26 de fevereiro de 1984,
quando mais de trezentas pessoas morreram pela explosão de um gasoduto.
Nunca alheio ao seu redor, Gilberto compôs músicas que registraram os
momentos político-sociais do Brasil. Na década de 1960, em plena ditadura
civil-militar no país, compôs Moteto em Ré Menor ou Beba Coca-Cola
para piano e orquestra, considerada a mais popular música erudita brasileira.
Inspirado pelo poema concreto de Décio Pignatari (1927-2012), o compositor
criou uma espécie de antijingle numa crítica ao consumo da sociedade moderna.
A terceira “ilha” enfoca as composições experimentais da década
de 1960, o uso de grafismos musicais e o diálogo com a poesia concreta.
Na esteira do movimento internacional conhecido como Nova Música,
Gilberto foi um dos pioneiros na América Latina. Em 1963, foi signatário do Manifesto
Música Nova e, logo em seguida, fundou o Festival Música Nova em
Santos. Gilberto Mendes teve uma intensa atividade como divulgador e
incentivador da música contemporânea no Brasil, organizando cursos,
encontros e concertos – que muitas vezes despertavam reações vivas do público e
da crítica. O Festival, ativo até hoje, já em sua 56ª edição, é um dos mais
duradouros e importantes eventos internacionais de música contemporânea da
América Latina. São dessa época, também, composições marcantes como Nascemorre,
Blirium C9, Moteto em Ré menor e Santos Football Music.
No quarto núcleo, encontramos sua relação com o teatro, antes
como compositor de música de cena, depois como criador daquilo que ele próprio
gostava de definir como Música-Teatro, em que uma ação teatral é
planejada como se fosse uma peça musical. As décadas de 1950 e 1960 foram de
intensa atividade teatral em Santos, principalmente graças aos movimentos do Teatro
Amador e do Teatro dos Estudantes, que contaram com o apoio de
intelectuais como Patrícia Galvão (Pagu), Paschoal Carlos Magno e Miroel
Silveira e revelaram talentos como Plínio Marcos e Sérgio Mamberti.
Gilberto Mendes compôs várias músicas para teatro nesse período
– especialmente para as encenações de Plínio Marcos –, muitas delas para fita
magnética, mais um recurso de que Gilberto foi pioneiro no Brasil. Nessa linha,
uma de suas principais composições é Último tango em Vila Parisi,
em que um acorde e uma única frase repetida pela orquestra servem de suporte a
uma ação envolvendo o regente e dois músicos. Além de ser um exemplo
especialmente complexo de Música-Teatro, Último tango lembra,
desde o título, o grande interesse de Gilberto pela montagem cinematográfica,
enquanto a referência à Vila Parisi (favela de Cubatão) nos lembra do
engajamento do compositor com os problemas sociais de sua cidade.
A quinta “ilha” trata de sua relação com a música de cinema a
partir de uma das composições mais importantes da sua última fase: Ulysses
em Copacabana surfando com James Joyce e Dorothy Lamour (1988).
Encomendada pelo Festival de Patras, na Grécia, a peça começa com a citação de
um hino a Apolo, que remonta à Grécia antiga, executado pelo clarinete, de
maneira a lembrar o estilo do primeiro Stravinsky, e procede por associações de
ideias até desembocar num foxtrot nos moldes das orquestras de salão e dos
conjuntos dos cafés ao ar livre, típicos das cidades mediterrâneas. Tudo é
construído a partir da colagem de frases repetidas, mas constantemente
ampliadas ou modificadas, segundo o uso bastante peculiar que o compositor
fazia dos procedimentos minimalistas.
Gilberto reconhecia que sua maneira de compor devia algo à técnica da montagem cinematográfica, tanto que deu o título de Música, cinema do som a uma antologia dos seus artigos e ensaios. Assim concebida, a peça é uma espécie de sobrevoo por seu imaginário e um resumo (desde o título) de suas paixões: a literatura, o cinema, a música de salão, o mar. E o Ulysses do título remete provavelmente não apenas à Grécia e a Joyce, mas também a seu próprio nomadismo musical e cultural: Ulysses é Gilberto.
Quem foi Gilberto Mendes
Gilberto Mendes nasceu em 13 de outubro de 1922, compositor natural de
Santos, onde sempre viveu e faleceu em 1 de janeiro de 2016. Foi aluno de
Savino de Benedictis, Antonieta Rudge, Cláudio Santoro e Olivier Toni.
Frequentou os Cursos de Darmstadt, entre 1962 e 1968. Fundador do Festival
Música Nova (1962), o mais antigo do gênero em toda a América Latina e desde
então seu diretor artístico, foi também signatário do Manifesto Música Nova
(1963), publicado pela revista Invenção.
Doutor em música pela ECA-USP, onde foi professor até se aposentar.
Atuou ainda como professor visitante da Universidade de Wisconsin-Milwaukee
(1978- 1979) e da Universidade do Texas em Austin (1983), ambas nos EUA. Sua
obra musical contempla três fases. A primeira delas dedicadas ao neofolclorismo
e à canção brasileira (anos 1950). Já a sua segunda fase se caracteriza pelo
experimento radical de novas possibilidades sonoras dos materiais musicais. A
partir de fortes relações com a poesia concreta paulista do grupo Noigandres,
tornou-se um dos pioneiros no Brasil da música concreta aleatória, serial
integral, mixed media, experimentando ainda novos grafismos e a incorporação da
ação musical à composição, com a invenção do teatro musical e do happening
(anos 1960 e 1970).
Por fim, sua terceira fase se caracteriza pela maturidade de uma
síntese, não só revisitando suas duas fases anteriores, como adotando novas
linguagens abertas pós-vanguarda (desde os anos 1980). Recebeu a Ordem do
Mérito Cultural, na classe de comendador, do Ministério da Cultura, das mãos do
então presidente Lula[MS1] . Verbetes com seu nome constam nas principais enciclopédias e
dicionários mundiais, como GROVE (Inglaterra), RIEMANN (Alemanha), Dictionary
of Contemporary Music de John Vinton (EUA) e inúmeros outros. Suas obras já
foram apresentadas nos cinco continentes, principalmente na Europa e EUA. Seus
dois livros, Uma Odisseia Musical (1994) e Viver Sua Música -
Com Stravinsky em Meus Ouvidos, Rumo à Avenida Nevskiy (2009), foram
publicados pela EDUSP. Foi membro da Academia Brasileira de Música e do Colégio
de Compositores Latino-americanos de Música de Arte, com sede no México.
Com direção e produção musical do compositor e regente americano Jack
Fortner, o Selo Sesc tem dois álbuns dedicados a obra de Gilberto
Mendes. O CD A Música de Gilberto Mendes (2010), com obras
inéditas instrumentais do compositor e algumas obras antigas. Além do CD duplo Festival
Música Nova (2016), cujo repertório traz a história do Festival criado
em 1962 e idealizado por Gilberto.
Sobre a Curadoria
Lorenzo Mammi possui graduação em Matérie Letterarie pela Università
degli Studi di Firenze (1984), doutorado e livre docência em Filosofia pela
Universidade de São Paulo (1998, 2009). É professor da Universidade de São
Paulo desde 1989. Tem experiência na área de Artes, com ênfase em Música e
Artes Plásticas, atuando principalmente nos seguintes temas: música, arte
contemporânea, filosofia patrística. Foi Diretor e Administrador do Centro
Universitário Maria Antônia, foi também diretor artístico e consultor do
Instituto Moreira Salles.
Sobre a pesquisa e desenvolvimento de conteúdo
Livio Tragtenberg é compositor, escritor e orientador de projetos de
educação ligados à criatividade e inclusão cultural no Brasil, Alemanha e
Estados Unidos. Criou as Orquestras de Músicos das Ruas de São Paulo, Miami,
Berlim e Rio de Janeiro. Tem vários projetos como o SOUND BRIDGES EXPERIENCE,
realizado com músicos refugiados em Frankfurt, Alemanha.
Serviço:
Exposição
Gilberto Mendes 100
Curadoria
Lorenzo Mammì
Abertura | Partituras Visuais: cartazes em serigrafia
6 de julho de 2023, às 19h
Período expositivo
7 de julho a 3 de dezembro de 2023
Horário de visitação
Terça a sexta, das 10 às 21h.
Sábados, das 10 às 20h.
Domingos e feriados, das 10 às 18h.
Acessibilidade:
Audioguia com
audiodescrição, videolibras, piso maquete tátil do espaço expositivo.
Classificação indicativa:
Livre | Entrada gratuita
Agendamento de grupos:
agendamento.consolacao@sescsp.org.br
Sesc Consolação
Rua Dr. Vila Nova, 245, Vila Buarque, SP.
Metrô Higienópolis/ Mackenzie.
Informações: (11) 3234-3000
Redes /sescconsolacao
então presidente Lula? [MS1]
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