Jaime Lauriano – Aqui é o fim do mundo _ panorâmica dos quinze anos de trajetória de um dos expoentes do novo momento da arte brasileira (28/04)

 


Exposição panorâmica da trajetória de quinze anos do artista nascido em São Paulo em 1985 reúne mais de 40 obras, dentre elas quatro criadas especialmente para a mostra. Jaime Lauriano é um dos expoentes do novo momento da arte brasileira, que repensa a história oficial do Brasil, e tem participado de importantes antologias a respeito. Ele já integrou oito exposições no MAR, uma delas como um dos curadores, junto com Flávio Gomes e Lilia Scwarcz. É dele o calçamento em pedras portuguesas na entrada do Museu, em que estão gravados os nomes das doze regiões da África que forneceram, por meio de seqüestros e outras ações violentas, a mão de obra escravizada levada ao Brasil. Essa instalação, chamada “A história do negro é uma felicidade guerreira”, foi feita em 2018, a convite dos curadores Nei Lopes, Evandro Salles, Clarissa Diniz e Marcelo Campos, para a exposição “O Rio do samba: resistência e reinvenção”, e deriva da série “Pedras Portuguesas” iniciada pelo artista em 2017.

 

Museu de Arte do Rio, Rio de Janeiro

[segundo andar]

Abertura: 28 de abril de 2023

Até:1 º de outubro de 2023

Curadoria: Marcelo Campos e Amanda Bonan

 

 

O Museu de Arte do Rio tem o prazer de apresentar a exposição “Aqui é o fim do mundo”, uma panorâmica dos quinze anos de trajetória do artista Jaime Lauriano (1985, São Paulo), com curadoria de Marcelo Campos e Amanda Bonan. A exposição reúne mais de 40 trabalhos, produzidos entre 2008 e 2023. Quatro obras foram comissionadas especialmente para esta exposição, e são inéditas: as pinturas “Invasão da cidade do Rio de Janeiro” (2023), 130 x 180 x 2,5cm; “Na Bahia é São Jorge no Rio, São Sebastião” (2023), 120 x 140 x 2,5cm; a instalação “Afirmação do valor do homem brasileiro” (2023), 100 x 350 x 5cm e o vídeo “Justiça e barbárie #2” (2023). A exposição integra a programação de dez anos do MAR.

 

Outros trabalhos nunca mostrados antes são “E se o apedrejado fosse você? #3” (2021), desenho feito com pemba branca (giz usado em rituais de umbanda) e lápis dermatográfico sobre algodão; e o conjunto das três obras “Bandeirantes #1” (2019), Bandeirantes #2 (2019) e “Bandeirantes #3” (2022), miniaturas de 20cm de monumentos em homenagem aos bandeirantes, fundidas em latão e cartuchos de munições utilizadas pela Polícia Militar e pelas Forças Armadas brasileiras, sobre base construída de taipa de pilão.

 

Jaime Lauriano diz que é muito importante esta exposição para ele, porque “acontece no momento que eu percebo minha produção bem mais madura, com mais complexidade nos temas abordados e no uso de materiais”. “É importante para mim reunir na mesma exposição tantos trabalhos, de períodos diferentes, e estou feliz e emocionado de apresentar também para o público e para as novas gerações de artistas este recorte, porque meu trabalho está muito interligado com o novo momento da arte brasileira, de revisitar sua história, pensar e fazer uma nova história do Brasil, e de mudança de protagonismo. Sou um artista que está intrinsecamente ligado com este movimento. Meus trabalhos fazem parte de grandes antologias sobre o pensamento dessas outras histórias do Brasil”, observa.

 

O artista conta que o que levou a trabalhar com arte foi o interesse em investigar, em primeira instância, sua história pessoal, “que é a história de meus ancestrais”. “Com o passar dos anos isso foi se tornando uma história social coletiva do Brasil, em que muitas pessoas tinham histórias semelhantes às minhas, dos excluídos e dos marginalizados socialmente. Daí assumi que eu precisava falar de minha história para que outras pessoas se identificassem com ela, e conseguissem elaborar seus próprios traumas, através dessa elaboração coletiva desse trauma chamado Brasil”.

 

Sobre sua primeira exposição panorâmica ser no MAR, ele diz: “O MAR apostou no meu trabalho ainda em 2015, mesmo ano em que a Pinacoteca do Estado de São Paulo também comprou uma obra minha. Mas diferentemente de outros museus, o MAR coleciona meu trabalho, acompanha minha trajetória, e é a coleção pública que mais tem trabalhos meus, com mais de dez obras. A importância de estar neste Museu é também a valorização deste acervo, de uma política de colecionismo, e minha primeira panorâmica não poderia estar em outro lugar que não o Museu de Arte do Rio”.

 

AQUI É O FIM DO MUNDO: NÚCLEOS E OBRAS

As obras de “Aqui é o fim do mundo” estão distribuídas em cinco núcleos: Experiência concreta, Colonização, Afirmação do valor do homem brasileiro, Recantoe Justiça e barbárie.

 

·                    EXPERIÊNCIA CONCRETA reúne trabalhos em que a palavra “concreta” se refere tanto ao movimento da arte brasileira (concretismo e neoconcretismo) como também à realidade enfrentada pelos negros no Brasil. Estará o conjunto de três trabalhos feitos em 2019, com sacos de transporte de grãos, que abordam a triangulação atlântica do tráfico negreiro: “Experiência concreta #6 (triângulo atlântico)”, “Experiência concreta #7 (triângulo atlântico)” e “Experiência concreta #8, cada um com 130cm x 100cm x 3cm. O MAM da Bahia tem uma edição deste conjunto.

 

Em “Experiência concreta #1 (diálogo de mãos)”, de 2017, a impressão de várias imagens retiradas de jornais digitais, catálogos de exposições e manuais de sobrevivência mostram corpos negros amarrados, emolduradas em uma caixa de compensado naval. “Experiência concreta #2 (diálogo de mãos), de 2017, pertencente ao MAR, estão várias cordas, de diferentes materiais, com a mesma moldura.

 

Um cubo de 2 metros de altura e 4 centímetros de comprimento construído com silver tape diretamente na parede é a instalação “Experiência concreta #5 (sete linhas), 2017, em alusão aos cubos de Geraldo de Barros (1923-1998).

 

·                    COLONIZAÇÃO traz a pintura inédita “Invasão da cidade do Rio de Janeiro” (2023) – uma das obras comissionadas para a exposição – em que Jaime Laurianofaz diversas intervenções com pinturas e colagens em uma reprodução da pintura de Antonio Firmino Monteiro (1855-1888) “Fundação da cidade do Rio de Janeiro”. Na obra de 130cm x 180cm x 2,5cm estão o canarinho pistola – mascote da seleção brasileira de futebol – em cima do Pão de Açúcar;a medalha de 1974 em homenagem à cidade da Guanabara, extinta em 1975, quando houve a fusão dos estados da Guanabara e do Rio de Janeiro; a gravura de Johann Moritz Rugendas (1802-1858) retratando um mercado de escravos na região do Valongo, no Rio de Janeiro, em 1835; e um Cruzeiro do Sul (estrelas que representam a Bahia, Rio, São Paulo,Espírito Santoe Minas) feito pelo artista com tiros com espingarda de chumbinho.

 

As obras “Colonização” (2016), composta por um pilão de madeira, pedras portuguesas e azeite de dendê; e “Tratado #2” (2015)“, um pelourinho, em madeira de cumaru de 2m de altura, que o artista içou e jogou sobre um espelho de 70 x 70cm –  pertencem ao MAR.

 

Em “Colonização #2” (2022), um alguidar com 28 pedras portuguesas fundidas em latão repousa sobre um apoti – banco utilizado em terreiros de candomblé – coberto por uma esteira de palha taboa.

 

“E se o apedrejado fosse você? #3” (2021) faz parte do conjunto de desenhos criados por Jaime Lauriano desde 2015, em que usa pemba branca, giz usado nos rituais de umbanda sobre tecido de algodão preto, e refaz o mapa da história do Brasil.

 

Em “Trabalho, 2017” (2017), um painel de 5m de comprimento e 2,5m de altura, o artista usa objetos que retratam a naturalização da escravidão no Brasil – calendários, camisetas, cartões-postais, cédulas de dinheiro, entre outros – e a lista de profissões com maior incidência de pessoas negras no Brasil, que são as de baixa remuneração, mão de obra braçal, e sem exigência intelectual. Estão ainda depoimentos que relatam o racismo estrutural no Brasil, e reproduções de obra dos pintores europeus que viajaram ao Brasil Johann Rugendas (1802 – 1858) e Henry Chamberlain (1796 -1844).

 

·                    AFIRMAÇÃO DO VALOR DO HOMEM BRASILEIRO tem ao todo 30 trabalhos, e abre com a instalação de parede, medindo 2,50m de altura por 3,5m de comprimento, “Afirmação do valor do homem brasileiro” (2023), composta por recortes de revistas brasileiras de 1970, durante o governo Médici, como a icônica reportagem de capa “Nestas esquerdas o Brasil confia”, da revista “Realidade”, com uma foto de Tostão, Gérson e Rivellino.

 

Da série de 20 bandeiras do Brasil desenvolvida pelo artista entre 2015 e 2021 estarão nove obras, confeccionadas em várias técnicas artesanais por diferentes pessoas em diversas cidades brasileiras, uma delas criada em tricô por sua própria mãe: “Bandeira nacional #4” (2016), “Bandeira nacional #5” (2016) – ambas integrantes da coleção do MAR – “Bandeira nacional #7” (2016), “Bandeira nacional #9” (2016), “Bandeira nacional #10” (2016), “Bandeira nacional #12” (2021), “Bandeira nacional #13” (2021), “Bandeira nacional #14” (2021), e “Bandeira nacional #15” (2021). As identificações de cada uma obedecerão às regras de fichas catalográficas da Biblioteca Nacional.

 

Pela primeira vez serão exibidas juntas as obras “Bandeirantes #1” (2019), “Bandeirantes #2” (2019), pertencente ao MAR – nunca mostrados antes – e “Bandeirantes #3” (2022), miniaturas de 20cm de monumentos em homenagem aos bandeirantes, fundidas em latão e cartuchos de munições utilizadas pela Polícia Militar e pelas Forças Armadas brasileiras, sobre base construída de taipa de pilão.

 

Da série “Brinquedo de furar moleton” (2018) – instalação com tijolos coloniais e miniaturas fundidas em latão e cartucho de munição recolhidos em zonas de conflitos armados em cidades brasileiras – estão 12esculturas:“Tanque”, pertencente ao MAR, (Caravela), (Avião de guerra), (Base móvel), (Caveirão), (Helicóptero militar), (Porta aviões) e cinco viaturas da Polícia Militar.

 

A obra “Ocupação” (2022), em lápis dermatográfico sobre algodão vermelho, com 1,60m de altura e 3,10m de comprimento, traz palavras de ordem de movimentos sociais.

 

·                    RECANTO

Jaime Lauriano diz que cada trabalho deste núcleo “é uma oferenda para um orixá. Nelas podemosencontrar todos os elementos ritualísticos para louvar os orixás: plantas para tomar banho, cores paras as roupas, desenhos de invocação etc. São elementos para ser curado”.

 

A instalação “Iluminai os terreiros” (2022) – da música “Brasil pandeiro” (1941), de Assis Valente – cria um círculo, uma roda, com 14 apotis (os bancos de madeira usados em casas de umbanda e terreiros de candomblé) e esteiras de palha, onde o público poderá se sentar e se deitar, além de alguidares. A trilha sonora do trabalho é a sequência de entrevistas feitas pelo artista com lideranças negras do Rio e de São Paulo, de várias áreas. Ao longo da exposição Jaime Lauriano fará novas entrevistas, que serão incluídas na trilha.

 

Em “Felicidade guerreira” (2021) – título retirado da música “Zumbi, a felicidade guerreira” (1984), de Gilberto Gil e Wally Salomão, composta para o filme “Quilombo”, de Cacá Diegues – outro desenho da série feita com pemba branca sobre tecido de algodão preto – estão distribuídas no mapa do Brasil dez revoltas de negros escravizados, ocorridas antes e depois da Independência.

 

“Ele é dono do meu destino até o fim” (2022), em tinta acrílica, impressão com jato de tinta, contém miniaturas de chumbo, estampas e fita silver tape sobre mdf.

 

“Na Bahia é São Jorge no Rio, São Sebastião” (2023) obra comissionada para a exposição, Jaime Lauriano toma emprestado como referência a música de Toninho Geraes e a pintura de Heitor dos Prazeres para criar um panteão em homenagem aos orixás.

 

·                    JUSTIÇA E BARBÁRIE

Neste segmento estará o vídeo “Morte Súbita” (2014), 24’51, em looping, que tem como trilha sonora a voz de um narrador oficial do Estado de São Paulo, lendo os nomes de mortos e desaparecidos em 1970.  O vídeo mostra a utilização feita pelo regime ditatorial da Copa de 1970, e será exibido em uma sala especial, em que a porta de entrada será coberta por um lambe-lambe de uma fotografia feita pelos policiais, durante a ditadura militar, em uma ação no Centro do Rio de repressão a manifestantes.

 

“O Brasil” (2014), com 19’, é outro vídeo deste núcleo, e resulta de dois anos de pesquisa do artista em arquivos oficiais. Dos 700 filmes de propaganda, em tom ufanista, feitos pelos governos da ditadura no período do AI-5 (1969 a 1974), ele selecionou 30. As imagens são entrecortadas por matérias de 31 de março e 1º de abril de 1964, e de 13 a 16 de dezembro de 1968. Na trilha sonora, o áudio de Auro de Moura Andrade, presidente do Congresso, decretando a vacância na presidência do Brasil, mesmo estando no país o então presidente João Goulart, e a leitura feita na televisão por Golbery do Couto e Silva, da promulgação do AI-5.

 

Outra obra pertencente a este núcleo éa serigrafia sobre flanela, 28 x 38cm, “Queime depois de ler” (2012), com a receita de um coquetel molotov.

 

Os vídeos “Sem título #1 (a casa)”, 2008, 1’38; e “Sem título #3 (a casa)”, 2010, 1’49,são resultantes da residência artística que Jaime Lauriano fez em 2007 na “cracolândia”, em São Paulo, em que registrou ações de “higienização” urbana do governo municipal. A trilha sonora é formada por propagandas de venda de imóveis.

 

“Justiça e barbárie #2” (2023) é um ensaio visual com imagens da invasão de Brasília feita no dia 8 de janeiro, mixadas com legendas retiradas da internet e de grupos de zap de bolsonaristas. A trilha sonora é de Gustavo Sarzi.

 

 

EXPOSIÇÕES NO MAR COM A PARTICIPAÇÃO DO ARTISTA

·         “O Pixinguinha: um maestro batuta” (2022)

·         “Coleção do MAR + A Enciclopédia negra” (2022), como um dos curadores, junto com Flávio Gomes e Lilia Schwarcz

·         “O Rio dos Navegantes – Episódio 2” (2019)

·         “O Rio do Samba: resistência e reinvenção da cultura do Rio de Janeiro” [2018 – 2019]

·         “Quem não luta tá morto arte democracia utopia” (2018)

·         “A cor do Brasil” (2016)

·         “Rio Setecentista” (2015)

·         “Tatu: futebol, adversidade e cultura da caatinga” (2014)

 

 

Serviço: Jaime Lauriano – Aqui é o fim do mundo

Museu de Arte do Rio
[segundo andar]

Abertura: 28 de abril de 2023

Até:1 º de outubro de 2023

Curadoria: Marcelo Campos e Amanda Bonan

Praça Mauá, Centro, Rio de Janeiro-RJ
21 3031-2741

A bilheteria do museu funciona de quinta-feira a domingo das 10h30 às 17h, sendo possível permanecer no Pavilhão de Exposições até às 18h. 

Ingresso: R$20,00 (inteira) e R$10,00 (meia). 

Agendar uma visita: agendamento@museudeartedorio.org.br ou +55 (21) 3031-2742.

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