Lançamento: ORIXÁS NO TERREIRO SAGRADO DO SAMBA - Exu e Ogum no Candomblé da Vai-Vai

 


Prefácio: Dr. Vagner Gonçalves da Silva (fflch/usp) 

                                  Apresentação: Thobias da Vai-Vai (presidente de honra)

O livro é uma narrativa sobre duas manifestações que sempre dialogaram: religiões afro-brasileiras e escolas de samba, segundo a jornalista e autora, Claudia Alexandre. A obra sugere um “olhar desfragmentado” sobre a presença das tradições de matrizes africanas em expressões culturais, que ajudaram a construir o que chamamos de identidade nacional. Vemos que, ao longo do tempo, o que era uma forma de perceber o mundo foi sofrendo rupturas provocadas por interpretações e ações hegemônicas. O que inclui o assombro da indústria cultural e as violências da intolerância religiosa. De qualquer forma, religar esses universos, tensionando o ambiente acadêmico e revisitando acervos das experiências negro- -africanas em diáspora, também nos revela novos caminhos para (re)escrever a História do Brasil a partir da história dos sambas e das escolas de samba.


A autora, “devidamente” autorizada, adentrou a encruzilhada da Vai-Vai, um território negro paulistano onde reinam Exu, o orixá mensageiro, e Ogum, o guerreiro. Lá, encontrou um terreiro que as telas das televisões não são capazes de registrar. O carnaval negro não pode ser concebido sem os cultos ancestrais, porque há uma ardidura que os mantém em uma potente ligação. 

A Escola de Samba Vai-Vai foi fundada em 1930 por um grupo de negros e, apesar das transformações inerentes ao tempo, ainda mantém um sistema religioso que ultrapassa os limites do sagrado-profano, em total conexão com os valores ancestrais. Nesse terreiro nada está separado: é o pavilhão preto e branco, com seus ramos de café e a coroa de rei; é o surdo de primeira, a divindade que dá o ritmo na avenida; mas é também o toque para os orixás, as procissões que embalam as ruas do bairro; são os altares para os santos das macumbas; é o pai de santo e é o quarto de Exu e Ogum. A africanidade se compõe para continuar desafi ando as narrativas que insistem em colocar samba de um lado e orixás de outro. Orixás no terreiro sagrado do samba – Exu e Ogum no Candomblé da Vai-Vai também evoca a ancestralidade para mostrar como outras linguagens e outras expressões foram reinventadas em redes de pensares, saberes, fazeres e negociações, que driblaram todas as tentativas cruéis de se fazer esquecer um passado ou para eliminar sujeitos de sua própria história.

O terreiro sagrado da Vai-Vai é lugar de reverenciar nomes de gente que reza e continua sambando entre os seus. É o encontro constante do passado com o presente, na trajetória de Pé Rachado, Geraldo Filme, Chiclé, Dona Nenê, Dona Marcinha, que ainda estão ali em todos os altares que são acesos por Fernando Penteado, Osvaldinho da Cuíca, Thobias da Vai-Vai e Sandrinha, que cuidam do quarto de Exu e Ogum.

“O que eu encontrei na escola de samba Vai-Vai foi uma tradição que revive a matriz africana e surpreende porque está ali na encruzilhada de Exu, não apenas dando sentido identitário à comunidade, mas político e de resistência também. Os símbolos do Candomblé, envolvidos na rotina da festa, o calendário religioso, embalados pelos sambas formam um verdadeiro terreiro sagrado do samba em plena São Paulo”, disse Claudia Alexandre.


 Sobre a Obra

O livro é fruto da dissertação de mestrado em Ciência da Religião (puc-sp/2017) da jornalista e pesquisadora Claudia Alexandre. A autora, que tem vivências e trânsitos nos universos das religiões de matrizes africanas e nos sambas, apresenta, a partir de seu trabalho acadêmico, uma investigação sobre as origens das manifestações afro-brasileiras, desde os primeiros batuques, onde as práticas dos povos negros se confundiam entre o profano e o sagrado, até as passarelas do samba, onde destaca a experiência da comunidade negra que ocupou o famoso bairro do Bexiga, em São Paulo, e deu origem à Escola de Samba Vai-Vai. É nesse terreiro de samba que ela vai encontrar uma complexa relação entre os sambistas e os cultos do Candomblé. A Vai-Vai mantém um sistema religioso próprio, que possibilita em seu espaço de festa o culto aos orixás patronos da comunidade: Exu e Ogum.

 A autora explica: “Acho importante destacar que encontrei uma religiosidade na escola de samba Vai-Vai para além do resultado estético do espetáculo apresentado nos desfiles carnavalescos, algo que não se vê na tela da televisão. O olhar fragmentado, reproduzido pelos meios de comunicação será incapaz de revelar o que sustenta a devoção daqueles sambistas no momento máximo da festa. Com certeza, ali a paixão transcende o componente e a escola de samba na passarela parece se transformar em um templo religioso.” É exatamente o que nos traz Edmilson de Almeida Pereira: “no decorrer dos desfiles das grandes agremiações, quando os meios de comunicação captam, em plano geral, a massa de anônimos e, em close, os personagens famosos do mundo do espetáculo, estão de fato captando uma fração do carnaval”.


 O livro é dividido em três capítulos: O primeiro, Batuques e performances do corpo negro: onde resistiu sagrado e profano, explora alguns acervos da cultura afro-brasileira para descrever como práticas rituais dos negros escravizados romperam perseguições e opressões e se mantém em manifestações da cultura popular. Mostra como samba, a roda de samba e as escolas de samba ganharam as ruas e se espalharam em expressões culturais populares. Focaliza a cidade de São Paulo, incluindo um breve histórico sobre práticas rituais de Macumba, Umbanda e de Candomblé na capital paulista.


 No segundo capítulo, Vai-Vai: um território negro, aborda a formação do Bexiga, bairro da região central de São Paulo, onde está localizada a quadra de ensaios, ou o terreiro de samba, do Grêmio Recreativo Escola de Samba Vai-Vai. Investiga como a origem da agremiação carnavalesca se insere no contexto sócio-político-cultural da cidade; aborda o valor da ritualidade indispensável para as práticas das tradições de matrizes africanas, que também estão presentes nas escolas de samba.

. O terceiro e último capítulo, Exu e Ogum no terreiro do samba, volta-se para as práticas de Candomblé realizadas na escola, mostrando como o terreiro de samba é concebido pela comunidade como “terreiro sagrado”, onde práticas de devoção aos orixás patronos.


 O pósfácio reverencia as matriarcas da tradição do culto à Exu na Vai-Vai, Mãe Nenê e Dona Marcinha, dando centralidade a fi gura da mulher nas tradições de matrizes africanas e também na constituição histórica das escolas de samba, remetendo a Hilária Batista de Almeida, Tia Ciata de Oxum (1854-1924), mulher negra, nascida em Santo Amaro da Purifi cação (Bahia), que se tornou um símbolo da formação das primeiras redes de solidariedade no Rio de Janeiro (século XIX), possibilitando a proteção para o surgimento do samba e, posteriormente, das escolas de samba.


Cláudia Alexandre 


Sobre a autora:

Claudia Alexandre, jornalista e apresentadora de Rádio e tv, é especialista, mestre e doutoranda em Ciência das Religiões pela puc - -sp. Foi assessora especial da Fundação Cultural Palmares (MinC) e assessora de comunicação do Museu Afro-Brasil e da União das Escolas de Samba Paulistanas (uesp). Como locutora da Transcontinental fm, despontou como a principal voz feminina negra das rádios paulistanas. Em 2018, criou a plataforma digital br Brazil Show (@brbrazilshow), onde produz conteúdo e apresenta o programa “Papo de Bamba”. É colunista do programa “O Samba Pede Passagem” (usp fm) e foi comentarista de Carnaval da Globonews sp (2019–2020). Afroempreendedora, dirige a agência Central de Comunicação. Integra a Comissão dos Jornalistas pela Igualdade Racial sp (Cojira) e os coletivos “Acadêmicas do Samba” e “Mulheres do Axé do Brasil”. É autora dos livros Na fé de Vivaldo de Logunedé: um pouco do Candomblé na Baixada Santista (Secult Santos) e Vai-Vai: orgulho da Saracura (AB Editora). Também pesquisa a vida de Hilária Batista de Almeida, a Tia Ciata. Conheça mais sobre a autora em @claualex16.

Contatos:

Editora Aruanda: comercial@editoraaruanda.com.br Claudia Alexandre: claudiaalexandre.jornalista@gmail.com

 Este livro foi produzido em co-edição com a Editora Griot


Comentários