Coletivos e organizações - assinam manifesto para a construção de uma agenda comum de combate à discriminação racial nas empresas.
Este final de semana, centenas de organizações e lideranças negras se reuniram para dar vida a um coletivo que terá como objetivo principal a construção de uma agenda comum de combate à discriminação racial nas empresas.
Após o assassinato de João Alberto, que culminou em diversos, justas e necessarias manifestações pelo país, viu-se a necessidade de exigir das empresas e do Estado posturas antirracistas mais sólidas, específicas e duradouras.
Foi desta circunstância e do compromisso ético de ocupar.todos.os espaços necessários para que fatos.como esse nunca mais.voltem a ocorrer que nasceu a ideia da constituição de um comitê externo e independente que pudesse atuar junto ao Carrefour para, além de cobrar formas de reparação individual e coletiva para as vítimas dos atos racistas, organizar medidas antirracistas que orientem o mundo corporativo.
A ideia da formação do comitê dividiu opiniões, mas hoje foi compreendida como um ponto de apoio a reinvindicações históricas do movimento negro, como por exemplo, a revisão das formas de contratação e atuação dos serviços de seguranças, bem como a adoção de ações afirmativas. A reunião deste final de semana, assim como outras que ainda ocorrerão tem o objetivo de trazer para os membros do comitê, para sua atuação junto ao Carrefour, as propostas contidas no documento produzido pelo coletivo.
O que antes parecia a demanda dirigida a uma empresa agora se apresenta como um conjunto de diretrizes a ser direcionado a todas as empresas do país, organizado e defendido por mais de trezentas entidades do movimento negro, indígena , LGBT etc. Que nenhum negro deixe de ocupar todo e qualquer espaço que se apresente para o debate.
Que este Coletivo, que surge de uma horrível mas infelizmente recorrente tragédia em um Brasil estruturalmente racista, consiga influenciar não apenas as ações de um dos maiores varejistas do país. Mas todas as empresas que efetivamente se proporem a partir para ações práticas no combate ao racismo.
Aos necessários protestos e boicote devemos somar propostas para mudanças imediatas. É hora de nos juntarmos para a destruição do racismo e para a construção de um mundo novo.
"A POPULAÇÃO AFROBRASILEIRA
EXIGE RESPEITO"
“A POPULAÇÃO AFROBRASILEIRA EXIGE
REPARAÇÃO”
Nós, Coletivos, Organizações da Sociedade Civil e cidadãos,
diante das estratégias do racismo estrutural e institucional e da violência
sistêmica que nosso povo vem há séculos sofrendo, reiteramos publicamente nosso
posicionamento de total repúdio aos casos de racismo e outras formas de
discriminação ocorridos reiteradamente na rede de supermercado Carrefour e em
outros espaços, em especial o bárbaro assassinato de João Alberto Silveira
Freitas. Vale ressaltar que o Carrefour tem se notabilizado por episódios de
violência ocorridos em suas dependências e protagonizados por pessoas que
estavam sob sua responsabilidade.
Com indignação temos presenciado inúmeras e reiteradas
manifestações de ódio racial, com especial atenção nos espaços corporativos em
que se realiza atendimento ao público. Temos visto a repetição de múltiplas
formas de discriminação: racial, de gênero, de orientação sexual, religiosa,
contra pessoas com deficiência etc.
O que hoje vivenciamos é um verdadeiro abismo civilizatório em
que o assassinato de pessoas negras se tornou algo absolutamente banal. Por
este motivo, conscientes de nossa responsabilidade histórica diante de mais uma
grave violação de direitos humanos, nos reunimos a fim de propor junto ao
Comitê Externo e Independente ações efetivas que possam impedir que mais uma
pessoa negra seja assassinada. Entendemos que a ampla participação social é o
caminho assertivo para o enfrentamento das estruturas racistas.
Conhecedores da velha estratégia de “dividir para conquistar”
que caracteriza as armadilhas do racismo, compreendemos que o melhor caminho é
unir nossas propostas iniciais. Diante disso, exigimos:
- A devida indenização às eventuais vítimas
e/ou suas famílias, sem a necessidade de interposição de medida judicial
prévia. Exigimos que a família de João Alberto Silveira Freitas seja
devidamente indenizada e também amparada em sentidos material e
psicológico pelo Carrefour.
- A responsabilização
civil e criminal de todos os envolvidos no assassinato de João Alberto
Silveira Freitas, o que engloba os assassinos, mas também
aqueles que com sua negligência
em relação à governança da empresa concorreram para que essa barbaridade
ocorresse.
- A radical mudança nas práticas da segurança
e na própria concepção de “segurança” adotada pelos estabelecimentos
comerciais. Não aceitamos mais ser perseguidos, humilhados e agredidos em
nome da “segurança” da propriedade privada. Entendemos que a precarização do trabalho, potencializada pela
terceirização, é um fator que impulsiona o racismo. Por isso, exigimos
a internalização dos serviços de segurança. Deve, portanto, haver o cumprimento de regras rigorosas de
recrutamento e treinamento, com orientação e apoio de organizações do
movimento negro no combate a todo tipo de violação aos direitos humanos.
- Exigimos
que não apenas o Estado seja o principal responsável por amparar esse trabalhador
precarização. Exigimos que recursos financeiros e materiais sejam
disponibilizados para a
qualificação permanente,
possibilidade de progressão de função e carreira e incentivos
sociais os trabalhadores e seus familiares. Entendemos que aqui está em
jogo não apenas o conceito de atividade fim e atividade meio e as
possíveis permissões de contratação de mão de obra por empresa interposta.
Na verdade, o que se discute, são mais de 200 anos de história do Direito
do Trabalho, o equilíbrio entre o valor social do trabalho e a livre
iniciativa como preceitos e objetivos da República, a efetividade da
Justiça Social e a valorização da Dignidade da Pessoa Humana.
- Enquanto
permanecerem serviços terceirizados, deve ser implantado modelo rigoroso
de validação das empresas prestadoras de serviços e fornecedoras da cadeia
de compras e suprimentos. Devem ser inseridas cláusulas antirracistas em todos os contratos com fornecedores
e prestadores de serviço. Caso comprovado algum fato que implique em
violação dos direitos humanos, seu descumprimento deverá implicar na rescisão contratual.
- Seja
exigido de todas as empresas
terceirizadas atuantes nas áreas de vigilância e segurança patrimonial
a apresentação de certificado de
curso ministrado, com adequado treinamento dos trabalhadores, ministrados
por organizações negras. Os contratos vigentes devem ser adequados a
esta exigência até janeiro de 2021
sob pena de rescisão.
- Apresentação
dos protocolos de abordagem de segurança no interior das lojas. Os
protocolos devem ser objetivos e de conhecimento dos funcionários. Não
deve ser admitido qualquer procedimento que viole a dignidade da pessoa
humana.
- Que o
Carrefour e demais empresas do grupo assumam o compromisso de não
contratarem empresas de segurança que tenham, como proprietários ou
funcionário policiais da ativa e/ou ex policiais, bem como pessoas que
tiveram ou têm passagens por milícias.
- O
oferecimento de um plano detalhado para aceleração na carreira de negros e
negras na empresa, permitindo que cheguem mais rapidamente a cargos de
liderança, principalmente em áreas estratégicas para a empresa, tais como Recursos Humanos, Cadeia de Valor
(Compras e Comercial) Marketing e Comunicação (Interna e Externa),
Investimento Social Privado (Responsabilidade Social e Sustentabilidade),
Segurança Patrimonial e Tributos.
- Criação
de Ouvidoria Interna e Conselho de Segurança com a participação de
entidades da sociedade civil que atuam na área de Relações Raciais e
Direitos Humanos.
- Que, a
partir do dia 1º de janeiro de 2021, todas as prestadoras de serviços e
fornecedoras para a empresa comprovem adotar um plano de
inclusão de negros/as em todos os seus cargos de média e alta direção.
Caso não comprovem esta meta, devem ter seus contratos encerrados.
- O compromisso de implementação de ações
estruturantes e regulares de educação em direitos humanos para todos os
funcionários. Deve haver a demanda para que fornecedores, sobretudo na
área de segurança e vigilância, também o façam, sempre em parceria com organizações
do movimento negro.
- Apoio a instituições de ensino, liderado
por pessoas negras, distribuídas pelo país para formação profissional de
jovens negros e negras, com fornecimento de bolsas de estudo.
- Contratação de pessoas negras respeitando a
representatividade racial da população de cada estado do país, mas com
percentual mínimo de 50% de negros entre os novos contratados.
- Implementação de um dispositivo digital
para denúncias domésticas, de discriminação racial e de violência contra a
mulher no site e aplicativos da empresa, garantido o anonimato para
posterior encaminhamento aos órgãos competentes.
- Criação de um Programa
de apoio e fomento a Organizações,
Incubadoras e Aceleradoras voltadas
ao desenvolvimento do empreendedorismo negro nas comunidades locais.
- Programa de Inclusão de nanos, micros e pequenos empreendedores e
agricultores liderados por
gruposminorizados, tais como
quilombolas, ribeirinhas, povos originários entre outros na cadeia de valor (produtos e serviços).
- O uso de peças publicitárias contra o
racismo e a violência institucional, com propagandas em emissoras de TV e
redes sociais de largo espectro, proporcional ao tempo da prática do
espancamento, com assunção dos erros e gravames perpetrados, e
comprometimento com dinâmicas que eliminem a cultura que parece ter se
instalado na rede.
- O
Carrefour, assim como as demais empresas incorporem profissionais negros
especializados em comunicação antirracista e não violenta, e/ou empresas e
veiculos de comunicação negros como prestadores de serviço nas áreas de
marketing, comunicação interna e externa e comunicação institucional.
- Criação de um dia de combate ao racismo em
que o faturamento das vendas do dia, apurados em todas as lojas da rede em
território nacional, seja anualmente destinado a políticas de combate
racismo.
- Assim sendo, exigimos que a Empresa B3,
que coordena a bolsa de valores no Brasil, retire o Carrefour quaisquer
outras empresas e que tenham ocorrido caso de racismo da listagem de
empresas pertencentes à segmentação de Novo Mercado, e que haja a
suspenção no direito de negociar seus papéis na B3, até que a empresa
adote um plano antirracista com atividades e metas nítidas, conforme os
pontos desta carta aberta. A Bolsa de valores precisa cumprir seu papel
conforme a Constituição Brasileira, no artigo 198 e responder a carta
entregue pela EDUCAFRO ao seu Presidente. (https://www.educafro.org.br/site/a-educafro-quer-ir-ao-stf-para-cobrar-da-bolsa-de-valores-diversidade-em-todas-as-grandes-empresas/).
- Em cada cidade onde há unidades do
Carrefour, que sejam destinadas, a partir de 1º de janeiro de 2021, 100 bolsas
de estudos integrais para jovens negras e negros. Essas bolsas devem
cobrir todos os custos durante os anos dos cursos escolhidos pelos jovens
negras e negros.
- Que o Ministério Público do Trabalho
convoque para uma Audiência Pública o Comando Nacional do Carrefour e o
obrigue a assinar um TAC (Termo de Ajuste de Conduta) a partir dos pontos
dessa carta. Que o MPT fiscalize seu cumprimento com garra e determinação,
criando em cada Estado uma comissão mista com os movimentos sociais negros
e outros de direitos humanos.
- Que a empresa invista 10% do lucro anual em
instituições negras de combate ao racismo em diversos segmentos, tais como educação, cultura, economia
criativa, empregabilidade, saúde da população negra, fortalecimento de
lideranças negras, acesso a crédito, acesso a moradia, alimentação,
agricultura familiar, direitos civis, justiça, acesso à tecnologia,
comunicação, empreendedorismo, negócios entre outros.
- Que o Carrefour de comprometa com a criação de um programa de ações afirmativas, com
representatividade e proporcionalidade nas estratégias de investimento
social privado, filantropia, doações, ações e ativações de marketing e
marca, patrocínios e apoios e mecenatos.
- Que haja a criação de comitês externos e
independentes antirracistas, composto por pessoas negras em todas as
empresas de mais de 500 funcionários, com indicações de organizações da
sociedade civil.
- Que as
empresas se comprometam com a representação de pessoas negras em seus
Conselhos consultivos e administrativos.
- Que o comando do Carrefour se some
conosco e assume as propostas desse coletivo, a serem apresentadas em 5
dias, sobre as sugestões das mudanças que são ofensivas à população
afrobrasileira no Projeto de Lei 5660/2019, que tramita na Câmara e no
Projeto de Lei 135/2010 que tramita no Senado.
A rede Carrefour deve rever suas práticas no país. Exigimos o
mesmo de todas as demais empresas que atuam no Brasil, multinacionais ou não,
que providenciem uma revisão urgente de seus protocolos e apresentem à
Comunidade Afro-brasileira e à sociedade um plano que contemple o respeito à
diversidade e à equidade.
Comentários
Postar um comentário