REESTREIA | TEATRO
"OS UM E OS OUTROS", DA CIA LIVRE, VOLTA EM TEMPORADA NO TUSP
Realizado em parceria com a Cia Oito Nova Dança, o
espetáculo cria um diálogo entre a fábula contada por Brecht e a luta e
resistência dos povos ameríndios no Brasil contemporâneo
Figura 1 - Cena de Os Um e os Outros - Foto Cacá
Bernardes
Depois de estrear no Sesc Pompeia em agosto, com sessões
sempre concorridas, a Cia Livre e a Cia Oito Nova Dança realizam uma nova
temporada, também curta, de “Os Um e os Outros” no TUSP (Rua
Maria Antônia, 294, Vila Buarque, São Paulo), de 11 a 27 de outubro de 2019.
Na peça concebida pela diretora Cibele Forjaz em
parceria com a Cia Livre e a Cia Oito Nova Dança, os Curiácios são
o povo dos Um, que acredita que sua cultura é universal,
enquanto os Horácios são os Outros, ou
todos os múltiplos povos, que defendem a diversidade dos modos de existência. O
dramaturgo, poeta e encenador alemão Bertolt Brecht se
inspirou em uma guerra ocorrida na Roma Antiga para escrever, em 1933, “Os
Horácios e os Curiácios, uma obra que investiga modos de
resistência da chamada “época da contrarrevolução”, instaurada com a ascensão e
consolidação da Alemanha Nazista.
No texto de Brecht, os Curiácios invadem a terra dos
Horácios para roubar seus campos e minas. Frente à ameaça de perderem tudo
aquilo de que necessitam para viver, os Horácios decidem resistir. Em três
batalhas – dos arqueiros, dos lanceiros e dos escudeiros – o autor aborda
diferentes estratégias de luta, refletindo sobre formas de resistência ao
avanço do totalitarismo no mundo.
Para tecer esse diálogo entre a história escrita por Brecht
e a luta dos povos ameríndios no Brasil contemporâneo, as duas companhias
contam com a participação de artistas colaboradores e a presença especial de
convidados do povo Guarani M’Bya - moradores da Terra Indígena Tenondé-Porã, em
Parelheiros, multiplicando os pontos de vista da encenação num espetáculo que
mescla teatro, música, dança e projeção de imagens.
A narrativa em cena mantém como espinha dorsal o texto de
Brecht, mas a encenação justapõe a este material mensagens, documentos, relatos
e imagens que apresentam uma guerra em curso hoje no Brasil: a luta dos povos
originários pelo reconhecimento de seus territórios, pelo respeito aos seus
modos de vida e pela preservação da floresta, rios e demais seres vivos que ali
vivem.
A FÁBULA DE BRECHT E O BRASIL CONTEMPORÂNEO
Com o objetivo de discutir as relações entre os povos
indígenas e não-indígenas, o espetáculo faz uma justaposição entre o texto
original e a nossa situação atual, permeada por uma série de conflitos em torno
do pertencimento, valor e destino da terra. Essa disputa, que envolve a
demarcação de terras, dilemas sobre a preservação ambiental, projetos
político-econômicos de expansão agropecuária e de exploração de jazidas - temas
cada vez mais acirrados no país - é trazida para a cena por meio de farto
material iconográfico, filmado ao vivo em uma viagem de nove meses subindo o
Rio Xingu e, também, recolhido na imprensa nacional e internacional, em
instituições e publicações variadas. Enriquecendo essa preciosa fonte documental,
a peça é plataforma para mensagens em vídeo dirigidas aos "Karaí" ou
“Juruá” (ou, homens e mulheres não-indígenas) e seus líderes, enviadas pelos
líderes e viventes da região do Xingu.
A pesquisa do espetáculo, que envolveu os dois grupos
artísticos paulistanos, incluiu a visita da Cia Livre às regiões de disputa ao
longo do último ano, possibilitando a convivência com diversas culturas, povos
e comunidades indígenas. Essa ida a campo, a fim de trazer o teatro mais perto
da experiência viva, era objetivo da Cia Livre desde a montagem de Vem
Vai, o caminho dos mortos. Também vinha sendo realizada pela Cia. Oito Nova
Dança em criações anteriores, tais como Xapiri, Xapiripê, lá onde a
gente dançava sobre espelhos (criada em parceria com a Cia
Livre), Esquiva e Juruá (ambas criadas em
parceria com os Guarani M’Bya).
Assim como o texto de Brecht apontava para conflitos pela
supremacia na exploração das fontes naturais por meio das barragens, pastos e
garimpos, o Brasil dos tempos de hoje não oferece contexto muito diverso
daquele ficcionalizado em 1933. O que se vê é a reprodução de violências
motivadas por mais um ciclo de exploração, mudando apenas os agentes interessados
nesses recursos naturais e as formas de violência com que atropelam direitos,
para atingirem o lucro visado.
Nesse sentido, a Cia Livre alinha-se à resistência. Também
propõe uma reflexão sobre como o mundo pode ser transformado e de que maneira
as ações que podemos tomar nos dias de hoje são capazes de alterar o destino de
exploração, expropriação e destruição que se avista no futuro próximo.
Como diz o xamã Yanomâmi Davi Kopenawa, em entrevista ao
etnólogo Bruce Albert no livro A queda do céu, que relata o fim do
mundo se os brancos continuarem agindo predatoriamente em relação à natureza e
à vida na Terra, "o céu cairá sobre as nossas cabeças". Sobre
este assunto, Kopenawa explica que, uma vez que a harmonia na Terra é quebrada,
o céu despencará para todos. A mensagem sobre o risco que representa a morte
dos povos originários, guardiões da floresta, e a consequente “queda do céu”
também é proferida pelo cacique Tinini, do povo Yudjá, numa das mensagens
divulgadas no espetáculo (filmada na aldeia Tubatuba, no Território Indígena do
Xingu, e dirigida ao novo governo). A constatação para muitos, inclusive
cientistas, pesquisadores e ambientalistas, é a de que estamos à beira desse
momento.
SINOPSE
"Os Um e os Outros", um musical livremente adaptado
de "Os Horácios e Os Curiácios", de Bertolt Brecht, em forma de
opereta, faz uma justaposição das batalhas narradas pelo autor com a luta dos
povos ameríndios no Brasil de hoje.
Dirigida por Cibele Forjaz, com coreografias de Lu Favoretto
e música de Gui Calzavara e Adriano Salhab, "Os Um e os Outros" faz
uso de diversos formatos e linguagens, como o teatro, o audiovisual, a dança e
a música, e conta com a parceria da Cia Oito Nova Dança. Estão em cena, além de
Cibele Forjaz e Adriano Salhab, Fernanda Haucke, Fredy Allan, Gisele Calazans,
Lu Favoreto, Lucia Romano, Marcos Damigo, Roberto Alencar e Vanessa Medeiros. O
espetáculo conta ainda com a presença de integrantes da comunidade Guarani
M'Bya da Terra Indígena Tenondé-Porã, situada em Parelheiros (Zona Sul de São
Paulo), que ampliam a discussão evocada pelo teatro.
FICHA TÉCNICA
JOGADORXS:
Adriano Salhab, Cibele Forjaz, Fernanda Haucke, Fredy Allan,
Gisele Calazans, Lu Favoreto, Lucia Romano, Marcos Damigo, Roberto Alencar e
Vanessa Medeiros
Contra regra em cena: Jackson Santos
Músicos em cena: Adriano Salhab e Gabriel
Máximo.
Composições de trilha origina, Direção Musical e
Arranjos: Adriano Salhab e Guilherme Calzavara
Desenho de som e Sonoplastia: Ivan Garro
Direção de Arte: Cla Mor, Marília de Oliveira
Cavalheiro e Valentina Soares
Arquitetura cênica e Objetos: Marília de
Oliveira Cavalheiro
Figurino e Objetos: Valentina Soares
Vídeo: Cla Mor e Fábio Riff.
Assistência de vídeo: Annick Matalon, Lucas Brandão e
Mariana Caldas
Operação de vídeo: Cla Mor
Vídeo Mapping: Fábio Riff e Mariana Caldas |
Vapor 324
Luz: Cibele Forjaz e Matheus Brant
Operação de luz: Matheus Brant e Nara Zocher
Identidade Visual e Projeto Gráfico: Julia
Valiengo
Assistência de Direção: Gabriel Máximo e Jackson
Santos
Preparação e direção vocal: Lucia Gayotto
Preparação corporal e Direção de movimento: Lu
Favoreto
Assessoria de Imprensa: Márcia Marques | Canal
Aberto
Produtoras: Bia Fonseca e Iza Marie Miceli | Nós
2 Produtoras Associadas
Direção Geral e Encenação: Cibele Forjaz
Coro Convidado do povo Guarani M’Bya [em revezamento]:
Jerá Poty Mirī | Jerá Guarani, Tatarndy Germano, Karai
Negão, Karai Tiago, Poty Priscila, Karai Tataendy Ricardo
SERVIÇO:
"Os Um e os Outros"
De 11 a 27 de outubro de 2019
Sextas e sábado, às 21h | Domingos, às 19h
14 anos | 120 min. | R$20,00 inteira e R$10,00
meia
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