“ TRAGA-ME A CABEÇA DE LIMA BARRETO!” ESTREIA TEMPORADA EM SÃO PAULO



Sucesso de público e crítica, peça estrelada por Hilton Cobra celebra a genialidade de Lima Barreto, refletindo sobre loucura, racismo e eugenia

Fonte : Lau Francisco 
Fotos: Adeloyá Magnoni


Traga-me a cabeça de Lima Barreto!”, espetáculo consagrado pela crítica e público, chega a São Paulo para uma temporada de 12 de julho a 5 de agosto no SESC POMPÉIA. Escrito pelo diretor e dramaturgo Luiz Marfuz especialmente para comemorar os 40 anos de carreira do ator baiano Hilton Cobra, com direção de Fernanda Júlia do (NATA - Núcleo Afrobrasileiro de Teatro de Alagoinhas), a peça mostra uma imaginária sessão de autópsia na cabeça de Lima Barreto, conduzida por médicos eugenistas (movimento que acreditava na seleção dos seres humanos com base em suas características hereditárias), defensores da higienização racial no Brasil, na década de trinta. O propósito seria esclarecer “como um cérebro considerado inferior poderia ter produzido uma obra literária de porte se o privilégio da arte nobre e da boa escrita é das raças tidas como superiores?. A partir desse embate, a peça mostra as várias facetas da personalidade e da genialidade de Lima Barreto, refletindo sobre loucura, racismo e eugenia, a obra não reconhecida e os enfrentamentos políticos e literários de sua época.




A narrativa ganha força com trechos dos filmes “Homo Sapiens 1900” e “Arquitetura da Destruição” – ambos cedidos gentilmente pelo cineasta sueco Peter Cohen. O cenário, de Marcio Meirelles – um verdadeiro manifesto de palavras – contribui para a força cênica juntamente com o figurino de Biza Vianna, a luz de Jorginho de Carvalho, a direção de movimento de Zebrinha e a música de Jarbas Bittencourt. Os atores Lázaro Ramos, Frank Menezes, Harildo Deda, Hebe Alves, Rui Manthur e Stephane Bourgade – todos amigos e admiradores do trabalho de Cobra, emprestam suas vozes para a leitura em off de textos de apoio à cena.





Trazer Lima Barreto para o primeiro plano desse debate, encontrar um equilíbrio entre as reflexões sobre a eugenia e a vida e obra do escritor foi, para Luiz Marfuz – responsável pela dramaturgia da peça, um desafio: Obviamente estamos tratando de uma situação imaginária, um Lima idealizado. Ele sempre se colocou como um escritor militante; e isso é nitidamente visível não só nos romances, mas nas inúmeras crônicas em que defendeu suas ideias humanistas, com fortes doses de anarquismo e socialismo, posicionando-se contra a política, os governantes, o sistema econômico, as injustiças sociais. Mas a questão da eugenia não foi tratada por ele de forma direta e aberta. Então a arte cria um espaço para que Lima, após uma vida marcada pelo alcoolismo, loucura, a indigência cotidiana e a discriminação racial, retorne com a consciência dessas questões para defender suas ideias”, explica Marfuz.

Responsável pela direção do espetáculo, Fernanda Julia, que é diretora do NATA de Alagoinhas, conta como o trabalho que vem realizando no grupo teatral contribuiu no processo de direção de Traga-me a cabeça de Lima Barreto!: “O diálogo crítico e politizado sobre negritude é um disparador potente do fazer cênico do NATA. Esses elementos foram fundamentais para que eu percebesse quais caminhos trilhar na construção do espetáculo. Sou uma provocadora e problematizadora por natureza, e acho que a encenação deve seguir este caminho – provocar a reflexão e problematizar o que está posto. São dois caminhos que sigo e que fundamentam minhas escolhas poéticas e estéticas. Sou uma encenadora negra e afirmativa, desejo sempre colocar em cena a beleza, a grandiosidade e as vitórias do meu povo”, diz Fernanda.



Hilton Cobra, que criou a Cia dos Comuns em 2001 com o propósito de trazer à cena uma cosmovisão artisticamente negra especialmente no âmbito das artes cênicas, fala da motivação para encenar Traga-me a cabeça de Lima Barreto!: “É importante e providencial discutir eugenia e racismo a partir de Lima Barreto. Também é um reconhecimento à Lima – um autor tão pisoteado, tão injustiçado, que pensou tão bem esse Brasil, abriu na literatura brasileira ‘a sua pátria estética’, os pisoteados, loucos, os privados de liberdade – esses são os personagens de Lima Barreto. Acredito que ele deve ter sido, se não o primeiro, um dos primeiros autores brasileiros que colocaram esse ‘submundo’ em qualidade e com importância dentro de uma obra literária”.

Há um ano em cartaz, “Traga-me a cabeça de Lima Barreto!”, já foi apresentado para mais de 10.000 espectadores cumprindo temporada no Rio de Janeiro, Salvador, São Paulo, Porto Alegre e Teresina, onde colheu diversos elogios do público e crítica. O espetáculo foi encenado também na Flip – Festa Literária Internacional de Paraty/RJ, onde o escritor foi o homenageado. Em Salvador, foi contemplado com o Prêmio Braskem de Teatro/2017 de melhor texto (Luiz Marfuz), tendo sido indicado ainda nas categorias melhor ator e melhor espetáculo e no Rio de Janeiro contemplado com o 4º Prêmio Nacional de Expressões Cultuais Afro-brasileiras.

 “Traga-me a cabeça de Lima Barreto!” marca um reencontro de Cobra com a obra do escritor – em 2008, o ator protagonizou a versão cênica de Luiz Marfuz para o clássico da literatura O Triste Fim de Policarpo Quaresma. Desta vez, a peça é inspirada livremente em romances, contos e crônicas Lima, especialmente Diário íntimo e Cemitério dos vivos, consideradas autobiográficas. Trechos dos livros e da vida breve do escritor – viveu apenas 41 anos -  se entrecruzam com uma situação imaginária e se espalham em quatro espaços dramatúrgicos: o colóquio com a plateia; as confissões íntimas; a voz do delírio e o discurso dos eugenistas. Todos se enredam nos fios nervosos da cabeça encantada de Lima Barreto.

Reconhecimento do público e crítica especializada

Na Carta Capital, crítica de Rosane Borges:
“...A performance de Hilton Cobra é uma esplêndida feitura de como o teatro, em sendo arte, pode oferecer uma brecha para reposicionar a vida em outro patamar. Desde a caverna de Platão até as críticas contemporâneas da sociedade do espetáculo uma questão acompanha, como pedra no sapato, o papel do teatro em relação ao espectador: liberar os dominados das ilusões.
“Traga-me a cabeça...” faz diferente. Ao invés de laborar em torno de uma pedagogia do olhar, o monólogo nos provoca a enxergar um Lima Barreto, entre vários possíveis, com olhos de ver. Antes de considerar que “quem vê não sabe ver”, pactua com a plateia um deslocamento. O monólogo pede vênia a Lima Barreto e, com esse gesto, nos faz reconhecer a alta magnificência de um ator que, do alto dos seus 40 anos de carreira, perturba a boa rotina do mundo...”

Gilberto Bartholo, crítico teatral do Rio de Janeiro assim descreveu o espetáculo:
“...O texto é genial, mesclando ineditismo com frases de eugenistas e do próprio LIMA BARRETO. Tudo o que é dito se encadeia muito bem e se apresenta de uma forma meio didática, porém não enfadonha; muito ao contrário, é dinâmico, valorizado pela magnífica e irrepreensível atuação de HÍLTON COBRA, um ator de grandes possibilidades técnicas, que, parecendo imantado, atrai os espectadores, desde sua entrada triunfal em cena, e mantém essa atração até o apagar do último refletor. Dono de um carisma, de um talento e de uma gigantesca presença de palco, Hilton nos brinda com uma atuação inesquecível, um convite a voltar àquele espaço, para aplaudi-lo mais e mais...”

TRAGA-ME A CABEÇA DE LIMA BARRETO!

SERVIÇO:
De 12 de julho a 5 de agosto, quinta, sexta e sábado, às 21h30. Domingos, às 18h30. Sesc Pompeia – Rua Clélia, 93.
Espaço Cênico:
 60 lugares
Ingressos: R$6 (credencial plena/trabalhador no comércio e serviços matriculado no Sesc e dependentes), R$10 (pessoas com +60 anos, estudantes e professores da rede pública de ensino) e R$20 (inteira).

Classificação indicativa: Não recomendado para menores de 14 anos.


Ficha Técnica:
Ator - Hilton Cobra | Dramaturgia - Luiz Marfuz | Direção - Fernanda Júlia - | Cenário - Vila de Taipa (Laboratório de Investigação de Espaços do Teatro Vila Velha), Erick Saboya, Igor Liberato e Márcio Meireles Direção de Movimentos - Zebrinha | Direção Musical - Jarbas Bittencourt |Direção de Vídeo - David Aynnan  | Desenho de Luz - Jorginho de Carvalho e Valmyr Ferreira | Figurino -Biza Vianna  | Assist. Direção, Preparação corporal e vocal - Fernando Santana | Adereços - Dominique Faislon Design gráfico - Bob Siqueira e | Produção executiva – Afonso Drumond | Produção local – Lucimara Martins | Ass. de Imprensa – Marcia Vilela |Fotos - Adeloya Magnoni.

Participações especiais (voz em off): Lázaro Ramos, Frank Menezes, Harildo Deda, Hebe Alves, Rui Manthur e Stephane Bourgade  



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