Figura 1 Cena do espetáculo - Foto Isabel Praxedes
“Essa nova
montagem pretende friccionar o texto Navalha na Carne contra a própria pele a partir da realidade,
experiência e pesquisa de artistas, que, por meio de suas trajetórias,
articulam a presença negra na cena e na sociedade contemporâneas”. Rodrigo
dos Santos, ator
Estreia dia 19 de julho, às 21 horas,
no TUSP – Teatro da Universidade de São Paulo, o espetáculo NAVALHA NA
CARNE NEGRA com direção e dispositivo cênico de José Fernando Peixoto
de Azevedo. No elenco os atores Lucelia Sergio, Raphael Garcia e Rodrigo dos Santos.
A peça de Plínio Marcos, que no ano
passado completou 50 anos, é tida como um clássico do “teatro marginal”: aquela
cena que fazia ver a “escória da sociedade”. No caso de Navalha na
Carne, figuram três personagens, Neusa Sueli, Vado e Veludo, respectivamente,
uma prostituta, um cafetão e um camareiro gay, que, nas palavras do crítico
teatral Décio de Almeida Prado, fazem parte de um “subproletariado” – “uma
escória que não alcançara sequer os degraus mais ínfimos da hierarquia
capitalista”.
Se muitos a consideram uma obra
“datada” sob alguns aspectos, essa nova montagem pretende friccionar Navalha
na carne contra a própria pele – a realidade, a experiência e a
pesquisa de uma atriz, dois atores e um diretor negros, que vêm construindo
suas trajetórias através de uma proposta estética que articule a presença preta
na cena e na sociedade contemporâneas: José Fernando Peixoto de Azevedo,
dramaturgo, diretor teatral e professor da Escola de Arte Dramática da USP, foi
diretor e fundador do Teatro de Narradores (1997-2017) e colaborador do grupos
Os Crespos, além de dramaturgo do espetáculo “Isto é um negro?”; Lucelia
Sergio, da Cia Os Crespos (SP); Raphael Garcia, do Coletivo Negro (SP); e
Rodrigo dos Santos, da Cia dos Comuns (RJ), grupos que tem extensa pesquisa
teatral sobre o tema.
DO CORPO NEGRO, por José Fernando
Peixoto de Azevedo
A problemática do corpo preto e seus
históricos processos de marginalização social servem de mote central para nossa
montagem, que pretende lançar luzes sobre algumas questões relativas à
hierarquização social vigente nas sociedades contemporâneas. Essas questões
atravessam o texto de Plínio Marcos e reverberam na própria produção teatral
hegemônica em nosso país. Quem são esses “marginais” de Plínio Marcos hoje em
dia? Onde se encontram? Como vivem? Como lidam com seus desejos e necessidades?
Qual sua expectativa de vida? Será que se reconhecem como parte da “escória”? O
que esperam da sociedade – se é que ainda esperam alguma coisa?
Do corpo-mercadoria –
essa redução perversa da imagem do corpo preto produzida pela história da
escravidão – à mercadoria-corpo que é a prostituta Neusa Sueli estancando a
fome com seu sanduíche de mortadela; da sexualidade excessiva da “bicha” Veludo
à sexualização do corpo negro, esse corpo-objeto, ao qual não se
concede o direito ao desejo; e, a partir daí, até a fantasmagoria viril chamada
Vado, cuja expressão é a imitação de uma violência cuja gramática constitui uma
gestualidade macaqueada da violência naturalizada na figura do macho nacional.
DO
EXCESSO E DA EXCEÇÃO
São
excessos de vida e de morte, de potência e impotência, de grandeza e
insignificância, são vestígios de uma história marcada no corpo preto, feita de
gritos e de silêncios. Imaginar um futuro implica, para nós, lançar o olhar às
cicatrizes e permitir-nos a escuta de uma potência inaudita – provavelmente, a
voz de um anseio oprimido que jamais desistiu da vida.
Nessa
NAVALHA NA CARNE NEGRA, as figuras em jogo não são apenas vítimas ou imagens de
uma destituição absoluta. Elas são sobretudo figuras em luta: em
cena como na vida, a luta pela vida revela o quão portadoras de vida ainda são.
Na resiliência desses corpos adoecidos de sua negação, revela-se uma intuição
silenciosa, de que os atravessamentos produzem diferença, permitem que saibam
ainda o que são; como qualquer corpo doente, são corpos que imaginam cura.
DA
CENA
A cena se
constitui como um dispositivo-estúdio, em que as imagens são captadas e
transmitidas ao vivo, elaborando uma espécie de adesão: o ponto de vista da câmera
adere a Neusa Sueli. Presente o tempo todo em cena, a câmera, esse dispositivo
de olhar, de enquadramento, força a construção. O espectador vê o jogo em cena
e compara com o corte que assiste na tela. Os monitores revelam a dimensão do
corte, emoldurando o jogo e sua teatralidade. É preciso atravessar essa
saturação da imagem, do corte, do enquadramento, para conferir a suposta
totalidade da cena, já saturada de presenças, transitando entre o jogo
ficcional do texto e o jogo estrutural da captação de imagem. A luta entre as
personagens é duplicada pela tensão gerada por esse trabalho de captura da
imagem.
O olhar
dessa puta – essa Neusa Sueli preta, mulher, corpo-mercadoria –
contempla, porque precisa contemplar, a imagem de um futuro. Ela se mantém atenta,
examinando a miséria, o desespero e a desesperança, em busca de uma pista – o
mais sutil laivo de vida. Seu olhar há de nos indicar a direção do grande
salto.
FICHA
TÉCNICA
Direção
Geral e Dispositivo Cênico
José
Fernando Peixoto de Azevedo
Atores
Lucelia
Sergio
Raphael
Garcia
Rodrigo
dos Santos
Vídeo
Isabel
Praxedes
Flávio
Moraes
Iluminação
Denilson
Marques
Direção
de Arte
Criação
Coletiva
Assessoria
para o Trabalho Corporal
Tarina
Quelho
Programação
Visual
Rodrigo
Kenan
Produção
corpo
rastreado
SERVIÇO
NAVALHA
NA CARNE NEGRA
Local: Teatro da Universidade de São Paulo
| Centro Universitário Maria Antonia - Sala Multiuso
De
19/07/2018 a 12/08/2018
Temporada: de quinta a sábado, 21h; domingos
19h
Endereço: Rua Maria Antônia, 294 – Vila Buarque | São Paulo | SP
Bilheteria: R$ 20,00 inteira e R$ 10,00 meia.
Telefone: 11 3123.5222 | usp.br/tusp | fb.com/teatrodauspoficial
A
bilheteria abre 2h antes do início da sessão.
Classificação 16 anos | Duração 60
minutos
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